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31 de janeiro de 2014

Quinto experimento: o conceito de Priming

Artigo originalmente postado em Gestor FP.


O quarto experimento mostrou que o efeito do desconforto, em níveis moderados, é mais do que compensado pelo autocontrole. Em níveis extremos, por outro lado, esse mesmo efeito enfraquece o autocontrole (você pode acessar o post clicando aqui).


Dar elevada importância a alternativas que possam fazer com que nos desviemos de nossos objetivos de longo prazo é um grande obstáculo que, vez ou outra, nos deparamos. E é sobre isso que trata o quinto e último experimento.

Digamos que um estudante precisa se preparar para uma prova importante. Ele quer focar em seus estudos, mas seus pensamentos o levam à situações do quão prazeroso seria estar com seus amigos – isso, de alguma forma, pode se tornar mais importante e diminuir sua motivação para estudar, concorda? Porém, o fator social que concorre com a tarefa de estudar para o teste pode se tornar um interessante aliado fazendo com que o estudante mantenha um elevado nível de motivação para se dedicar aos estudos – tendo como provável consequência uma melhor preparação. Isso só é possível se, antes do evento, o valor da preparação para a prova for reforçado já que, depois de passado o teste, estudar não seria mais uma meta importante.

Antes de continuar, quero explicar um conceito em psicologia que, na literatura americana, se chama “priming”, pois no restante do texto vou usar essa palavra para não ficar explicando um conceito grande e acabar por tornar o texto repetitivo. Priming é a ideia de certas coisas que quando somos expostos (objeto, palavras, ideias, evento, experiência, etc.) ativam certos conceitos que induzem a determinado comportamento. Por exemplo: uma pessoa que acaba de comprar um carro novo pode começar a notar com mais frequência outras pessoas dirigindo a mesma marca e modelo do carro que comprou (já aconteceu isso com você?). Esta pessoa, portanto, foi “preparada” para reconhecer mais facilmente um carro como o dela por causa da experiência que tem ao dirigir e possuir aquele veículo específico. Outro exemplo: já percebeu que quando estamos envolvidos com alguma mulher que esteja grávida (amiga, irmã, prima, esposa, etc.) tendemos a perceber uma grande quantidade de mulheres grávidas no dia-a-dia? Parece que todas as mulheres resolveram engravidar na mesma época, não é?! Pois bem, é o “efeito priming” agindo na sua mente de novo. Explicado sucintamente o conceito, retornemos à quinta experiência.

Foi realizado um experimento com graduandos em enfermagem para testar essa premissa. Eles teriam de fazer uma prova sobre a disciplina de introdução à psicologia. Todo conteúdo da disciplina foi disponibilizado 3 semanas antes dessa prova: todos os participantes tiveram as mesmas condições de prazo para estudar. Algumas motivações sociais foram colocadas em forma de perguntas abertas relacionadas às suas vidas sociais, provocando assim o efeito priming com relação aos assuntos sociais. Essas perguntas foram feitas tanto 1 semana antes do teste quanto 1 semana depois do teste. O experimento teve, então, quatro variáveis: Priming Social (sim v.s. não) X Tempo (antes da prova v.s. depois da prova).

Os participantes receberam um caderno que continha as instruções e um questionário. A primeira parte do caderno foi desenvolvida para a situação de priming social. Foi pedido para que os participantes sob a condição de priming social se imaginassem em uma agradável situação social e, daí, respondessem a três perguntas abertas sobre sua vida social:

a. Quão importante é para você ser sociável? Explique o porquê.
b. Tente lembrar de uma situação em que você agiu de forma sociável. Descreva o que você fez e o que aconteceu.
c. Descreva o que você pode fazer para ser sociável e o que está envolvido ao se comportar de maneira sociável.

(Percebem que as ideias sob comportamento social são exaltadas nessa condição com essas perguntas? Essa é a ideia do efeito priming em ação!)

Os participantes que não estavam sob a condição de priming não responderam a essas perguntas. Todos os participantes responderam a segunda parte do questionário que procurou avaliar a importância de se estudar para a prova numa escala de 1 (não tão importante) a 11 (muito importante), com as seguintes categorias:

  • Importância de conseguir boas notas;
  • Importância de estudar para as provas;
  • Importância de dedicar esforços para estudar para as provas;
  • Importância de estudar para as provas no tempo livre;
  • Importância de ser um bom estudante;
  • Importância de superar a falta de interesse para estudar.


Daí os resultados:



Antes da prova os participantes enxergaram de forma mais favorável o ato de estudar quando motivos sociais foram colocados em evidência do que quando não foram. Depois da prova, no entanto, o valor pessoal para estudar foi baixo em ambas condições, já que a meta não era mais importante.

Os resultados desse experimento sugerem que é necessário levarmos em conta os processos de autocontrole que predizem as consequências motivacionais e comportamentais de um motivo priming. Quando um motivo priming ameaça o alcance de um objetivo de longo prazo (no exemplo inicial desse artigo seria “estar com os amigos é mais importante/prazeroso que estudar”), podemos acessar o controle contra ativo bloqueando esses impulsos. Nesse experimento, o fator social ameaçou a habilidade dos estudantes estudarem para a prova. Porém, em resposta à essa ameaça, os participantes reforçaram a importância de se estudar e, ao invés de enfraquecer tal motivação, o priming social (a ativação de conceitos sociais importantes) fortaleceu esse aspecto prevenindo, inclusive, que o desempenho dos participantes fosse prejudicado no teste.

Depois da prova, contudo, estudar não era mais uma meta importante que necessitava ser protegida contra desejos concorrentes e o priming social não ativou o reforço da importância de se estudar.

Uma ideia muito interessante que podemos associar às nossas vidas financeiras está relacionada ao ato de investir. Pensemos no seguinte caso em que a pessoa trabalha, recebe seu salário e, apesar disso, “não consegue guardar ou investir dinheiro algum”. A primeira coisa que deve ser feita (se já não foi feita) é realizar um diagnóstico de sua situação financeira. A partir disso, estabelecer os objetivos que se quer alcançar, especialmente aqueles que exigem investimentos. Daí definir o orçamento a ser seguido, ajustando as despesas de acordo com os objetivos e condições de vida. E, por fim, realizar a poupança e os investimentos. Esse é um dos caminhos, correto?

Porém, mesmo fazendo isso, tem pessoas que não conseguem guardar dinheiro. Podemos usar o conceito de priming a nosso favor. De que maneira? Simples: se, por exemplo, você sabe que seu pagamento vem todo dia 10, você pode se programar para ver de novo seus sonhos, seus objetivos, ver como os investimentos realizados estão progredindo, estudar alguns dias antes do pagamento sobre novos investimentos ou sobre o desempenho do seu atual investimento, ou seja: se envolver com seus objetivos para fazer com que sua disposição a investir aumente e seus esforços de poupança se intensifiquem, diminuindo a “dor” de realizar os investimentos para alcançar seus objetivos enquanto tem um “desejo concorrente”, uma oportunidade de consumo te tentando.

*

Tenho consciência de que não é fácil trazer essas ideias para nosso dia a dia, mas é bom que tenhamos consciência de como nossas mentes funcionam, provocando nossos comportamentos (muitos deles inconscientes). Faz parte do desafio, não é!?

Espero que tenham gostado dessa série de experimentos sobre o autocontrole. Uma boa semana e bons estudos!

Até!

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