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6 de maio de 2013

A tênue linha entre as normas sociais e as normas financeiras


Tenho aprendido algumas coisas bem interessantes sobre psicologia econômica e comportamento irracional devido a um curso que estou concluindo através do Coursera, A Begginer’s Guide Irrational Behavior.

Em um dos diversos estudos abordados por esse curso, o professor Dan Ariely chama a atenção para um assunto muito interessante relacionado às diferenças e confusões que acontecem sobre as normas sociais e normas financeiras, de mercado.

Imaginemos a seguinte situação: um rapaz leva uma moça para um encontro, um jantar. Depois do jantar ele leva a moça para o apartamento dela e antes de receber o provável apaixonado beijo de boa noite ele fala o seguinte: “Interessante... eu gastei R$ 150,00 no nosso encontro...” O que acontecerá? Muito provavelmente ele não receberá o seu beijo apaixonado. Mas o que aconteceu? Todo mundo sabe que o jantar, as bebidas, tiveram um custo. O que ocorre é que ao mencionar “dinheiro” evocou-se a ideia de prostituição: dinheiro por sexo. Em algumas situações colocar dinheiro na equação faz com que as coisas piorem. 

George Bernard Shaw fez uma piada bem interessante. 

Um homem perguntou a uma mulher:
- Você dormiria comigo por dinheiro?
- Claro que não! Não sou uma prostituta!
- E se te pagasse 1 milhão de dólares?
- Por um milhão eu dormiria com você!

Mais um exemplo. Digamos que eu precisasse trocar o pneu de meu carro. Em determinada situação te peço ajuda; muito provavelmente você fará de bom grado. Agora, por outro lado, imagine que eu te ofereça R$ 5,00 para me ajudar. O que acontece? Certamente você não ficaria eufórico e muito menos disposto a me ajudar a trocar o pneu por R$ 5,00! Talvez você pense: “me ofereça pelo menos R$ 50,00 e começaremos a conversar!”. A ideia é que quando a motivação financeira entra, a motivação social, sentir bem sobre si mesmo, bem em relação à sua ação, simplesmente desaparece.

A ideia básica é a seguinte: de um lado temos as normas financeiras, ditadas pelo mercado – se preciso que alguém execute um trabalho para mim, a construção de uma cassa, por exemplo, definimos o acordo de pagamento, por hora, por dia, por trabalho, etc. Por outro lado temos as normas sociais: se uma pessoa é casada ou está em um relacionamento de longo prazo as trocas não são muito claras.



Só que vivemos no meio desses dois extremos: entre as normas de mercado e as normas sociais. O interessante é que quando se adiciona o fator financeiro geralmente as coisas, as relações tendem a ficar piores.




Voltando ao exemplo da troca do pneu: se pedíssemos a alguém para nos ajudar a trocá-lo sua predisposição seria bem elevada; quando é oferecido pouco dinheiro esta disposição cai drasticamente, enquanto que com muito dinheiro ela tende a subir bastante



Mas o que acontece se você muda a relação para o domínio financeiro, para as normas de mercado? Uma série de experimentos conduzidos por Uri Gneezy e Aldo Rustichini em um jardim de infância mostram os resultados dessa mudança. (disponível em A Fine is a Price)

Algumas vezes, nos jardins de infância, os pais chegam atrasados para pegar seus filhos. O que acontece quando se atrasam? O professor olha para o relógio, olha para o pai, olha para ao relógio... para ter certeza de que o responsável entendeu que ele está atrasado. Os pais sentem-se culpados, se desculpam e tentam não repetir tal comportamento no futuro.

Sob a supervisão de Uri Gneezy e Aldo Rustichini esse jardim de infância introduziu um sistema de multas, de penalidades: se os pais se atrasassem eles teriam que pagar uma multa – algo não muito elevado, na casa de poucos dólares. O que aconteceu? Imagine que você seja um pai/mãe. Você está trabalhando no escritório em uma tarefa importante, olha no relógio e percebe que tem que sair para pegar seus filhos. Mas agora existe a multa. O que você diz? “Bom, agora tem a multa e por esse custo eu prefiro fazer algo mais importante. O jardim de infância pode ficar com meus filhos por mais algumas horas, talvez até umas 19h. Tenho coisas mais importantes a fazer”. O que aconteceu? Subitamente os pais começaram a se atrasar mais, pegar as crianças mais tarde; não existia mais culpa: existia um custo.

Nesse experimento, em algum momento, cancelou-se o sistema de multas, voltando para o sistema anterior. Será que isso seria possível, voltar às normas anteriores?

Ao introduzir uma multa o comportamento foi alterado das normas sociais para as normas de mercado e se tornou impossível voltar atrás

Uma história (verídica) para finalizar.

Na época da crise de 2008 teve uma mulher de Nova Iorque que colocou em anúncio na Craiglist (um tipo de classificado eletrônico nos EUA). Ela dizia ser linda e qualificada, maravilhosa em muitos sentidos. Ela entendia que mulheres lindas deveriam se relacionar com homens que ganhassem mais de $ 500.000 por ano. No anúncio dizia assim: “Eu sou tão bonita quanto essas mulheres que estão namorando homens que recebem $ 500.000 ou mais, mas pessoalmente estou presa, não consigo passar da barreira de $ 250.000; não posso me relacionar com homens que recebem isso e não encontro homens que recebem mais do que isso”. Daí ela pediu conselhos e sugestões de como lidar com tal situação.

O que ela disse muitas vezes é verdade: lindas mulheres casam-se com homens ricos. Essa é uma ideia que pode parecer preconceituosa, mas é uma verdade percebida. Porém, ela fez isso de um modo totalmente explícito.

Imagine que você tem o dinheiro para satisfazê-la e ela é linda o suficiente e vocês poderiam ficar juntos. O que esse relacionamento pareceria? Imagine que na primeira noite ela não queira nada ou não seja uma boa parceira. Seria uma transação bem estranha de beleza por dinheiro.

Porém, um homem retornou o anúncio. Ele escreveu: “Veja bem: sou rico o bastante, recebo muito mais que o montante requerido. E você parece ser muito bonita e acredito ser um acordo razoável. MAS meus ativos, o dinheiro, tendem a valorizar ao longo do tempo; porém seus ativos, a beleza, tenderão a se depreciar. E sob essas condições eu prefiro alugar do que comprar”. Resumindo: a proposta da mulher fez com que qualquer relacionamento migrasse das normas sociais para as normas de mercado, estragando suas chances. (clique aqui para acessar a história completa, em inglês)

Pense sobre seus relacionamentos, pense sobre onde eles estão entre as normas sociais e as normas de mercado e onde eles deveriam estar tanto nos relacionamentos sociais quanto nos relacionamentos de negócios.

Boa reflexão!